terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Aventuras e desventuras de uma viagem

Foto: Arquivo Pessoal


Viajar é uma aventura e dá um trabalho, né? Arrumar as malas, chegar cedinho no aeroporto, despachar bagagem, embarcar, enfim... Agora somem a isso uma "bagagem" a mais: a deficiência física.

Fazia quase 20 anos que eu não viajava de avião e, de lá pra cá, muita coisa mudou. Em 1995, quando fiz a cirurgia na perna em Campinas-SP, voar era bem mais complicado, mas eu era pequenininha e qualquer coisa poderia ir no colo (mesmo com gesso, eu era beeeem mais leve). Passado tanto tempo, não tínhamos a menor ideia de como seria uma nova viagem de avião, mas imaginando que as coisas haviam evoluído, resolvemos encarar o desafio. Afinal, devíamos uma visita à incrível família que nos acolheu quando fomos até lá consultar várias vezes, que nos deram tanta força antes, durante e depois da cirurgia. Desta vez, em uma fase ótima da minha vida, a viagem era apenas para passear e substituir as lembranças ruins por boas recordações. Com vovô e mamãe, lá fui eu nessa jornada.

É claro que a logística da coisa é bem complexa. Dias antes, telefonamos para a companhia aérea para pedir "condições especiais no embarque". Informaram que eu teria que despachar minha cadeira de rodas junto com a bagagem e usar uma cadeira da companhia até o embarque. Em Porto Alegre, o acesso ao avião seria feito através do "finger", esse negócio aí da foto:

Foto: Arquivo pessoal


No vídeo abaixo dá pra ver melhor como foi minha locomoção até a aeronave.



Foi tudo tranquilo. Parabéns ao atendimento da Tam, que possibilitou até mais do que eu esperava. Permitiram que eu usasse minha própria cadeira até entrar no avião, só depois ela seria guardada junto com a bagagem. No desembarque, a mesma coisa, esperei até que trouxessem minha cadeira e fui, bem lépida e pimpona, sem stress.

Em Congonhas, na volta, fomos informados de que talvez o avião não pudesse parar no tal "finger", mas que não havia problemas, já que outro equipamento, o "ambulift", já tinha sido solicitado.

Ambulift é uma espécie de elevador que leva o cadeirante até o avião, como aparece na imagem abaixo. Mas no fim nem precisei utilizar, já que nosso avião parou no "finger" e foi tudo uma beleza.

Foto: Divulgação


Então, parte aérea da viagem = nota 10.

Mas a saga teve seus percalços, se não seria muito sem graça...

Viajamos de Porto Alegre a Congonhas (SP), mas no final da tarde pegaríamos um ônibus para Campinas. Há um belo aeroporto em Campinas, o Viracopos, mas as passagens custavam o triplo do valor, por isso optamos por fazer uma paradinha em Sampa e visitar mais alguns amigos.

Aí foi um problema. Existe ônibus intermunicipal adaptado? NÃÃÃÃÃÃÃAÃOOOOO!

Antes de sair da capital gaúcha, pesquisei bem até encontrar uma empresa de ônibus que fizesse o percurso São Paulo-Campinas. Telefonamos pra saber sobre acessibilidade e informaram que os veículos possuíam a tal "cadeira de transbordo", essa bichinha aí da foto, que passa na porta do ônibus e leva o cadeirante até a poltrona. Eba, então tem jeito, maravilha!


Foto: Divulgação


Porém, ao chegarmos em São Paulo, descobrimos que a tal "cadeira de transbordo" é que nem Papai Noel e Coelhinho da Páscoa: "NON ECSISTE"!

Ahn? Mas tem um adesivo enorme no ônibus, indicando que é adaptado. Como faz? Vai voando? Aciona o teletransporte até a poltrona?

Resposta: senta no degrau e vai dando pulinhos até chegar à poltrona. Sim, eu fiz isso. Mamãe foi me saltando degrau por degrau até lá em cima.


Fotos: Arquivo Pessoal


É, minha gente, no país da Copa, o cadeirante não pode pegar um ônibus pra ir a outra cidade. Aliás, não pode muita coisa, vamos combinar. Não temos calçadas decentes, acessibilidade no transporte, locais públicos adaptados... Mas teremos estádios de futebol lindos e maravilhosos, isso que importa, né?

sábado, 25 de janeiro de 2014

Minha vida nas páginas de um livro


Grande parte dos livros tem o poder de nos fazer fugir da realidade, mergulhar num universo bem diferente do nosso e sonhar com personagens ficcionais. Mas há vezes em que a leitura serve para encararmos nossos próprios fantasmas, como ocorreu comigo recentemente.

Após ver em um blog literário a indicação de "A Menina de Vidro", da autora Jodi Picoult, fiquei super curiosa e já reservei um lugarzinho na minha estante. A obra conta a história de uma menina com Ostêogenese Imperfeita, ou "Ossos de Vidro", que nasceu com várias fraturas e fez outras tantas ainda na infância. Imediatamente, pensei: "Opa, essa é a minha vida!"

Quando ganhei de presente de Natal, levei poucos dias para "devorar" as quase 600 páginas. Saía de casa e só pensava em voltar para continuar lendo e chegar logo ao final, tamanho encantamento que senti com a história. Era a minha vida retratada em cada linha, em cada parágrafo, em cada página que eu virava com lágrimas nos olhos.

A história gira em torno da pequena Willow, que até os cinco anos já havia feito mais de 50 fraturas (bateu meu recorde, até os seis eu tive 25). Após uma desastrosa viagem à Disney, os pais são presos por suspeita de maus tratos, já que ninguém conhecia aquela doença rara, apenas verificaram que a menina tinha vários ossos quebrados. Indignados com a humilhação, eles decidem procurar um advogado para processar todos os envolvidos.

É aí que a história muda de rumo. O advogado diz aos pais de Willow que dificilmente eles ganhariam essa causa, já que as autoridades competentes fizeram seu papel, zelaram pelo bem-estar da menina acima de tudo. Espertalhão, o advogado explica que o processo pode ser outro: o de nascimento indevido.

Esse tipo de processo consiste em responsabilizar judicialmente o obstetra, por não ter diagnosticado a doença do bebê a tempo, dando à mãe a opção de interromper a gravidez. É claro que esse tipo de caso só existe nos Estados Unidos, onde o aborto é liberado.

Voltando ao livro, há muitos conflitos envolvidos, já que a médica que acompanhou a gestação era também a melhor amiga da mãe de Willow. O pai da menina também não aceita entrar com o processo, pois jamais diria no tribunal que não queria que a filha tivesse nascido.

Mas a mãe, Charlotte, leva a ação adiante, contrariando a tudo e a todos. Em busca de uma boa indenização para poder dar um futuro melhor à filha, ela e todos os envolvidos pagam um preço muito alto. Como diz a sinopse do livro: "Até onde você iria para garantir o futuro de um filho?" Ao longo do processo, muitas coisas se quebram, e não estou falando apenas dos ossinhos de Willow. Certas "fraturas" são mais profundas, não há gesso ou cirurgia que dê jeito.

Fiquei angustiada, com raiva da mãe de Willow durante todo o livro e não mudei minha opinião depois da última página. Uma criança especial tem um custo muito alto, financeira e emocionalmente, mas nada justifica o que a personagem fez, destruindo a vida de muita gente ao redor. Minha família passou e passa muito trabalho comigo, mas em nenhum momento, nem de brincadeira ou para ganhar uma ação judicial, eles diriam que seria melhor que eu não tivesse nascido ou que fosse "normal". Sei que se tivesse opção de escolher, minha mãe não me trocaria nem pela Gisele Bündchen. Sim, a modéstia é minha maior qualidade, hehe.